sábado, 31 de outubro de 2009

De novo sobre a ICA 100-25 e 1 Lembrete!

Lembrete do dia

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Caros amigos, retomo certos assuntos sobre a ICA 100-25.

Humilhante: "O efetivo de cada turno de serviço deverá ser ajustado conforme os gráficos de demanda do CGNA, de tal forma que o número de posições se adéqüe (SIC) ao volume de tráfego aéreo." à pg. 10 da Instrução do comando da Aeronáutica ICA 100-25. O verbo "adequar" é defectivo e como tal não se conjuga em todas as formas. Não há, portanto, nem "adéqüe" e nem "adeqúe" (e nem as notações de hora conforme modelo XX:YYh, entre outros vilipendios à norma culta).

A humilhação fica por conta de seu uso em uma Publicação Oficial a qual se preocupa mais em regulamentar o que já é regulamentado em cada OM. Inventa, tão somente, uma sigla (PIMO - Programas de instrução e Manutenção Operacional) e a dispõe apenas para obrigar e "dobrar" o efetivo BCT (controladores de tráfego aéreo militares) aos procedimentos militares a que antes se encontrava isento e, também, aplacar ânimos exaltados das outras especialidades aeronáuticas que laboram em horário administrativo (vide
esta representação feita ao MPF contra o CINDACTA 3).

Pois que este trabalhador BCT, para desempenho adequado na complexidade que lhe é exigida, embora militar, está mais sujeito aos ditames de Saúde e Segurança do Trabalho e Direitos do Trabalhador previstos por organismos internacionais da ONU como a OIT, a OMS, a própria OACI, abordado na ISMA (International Stress Management Association), sujeito as NR do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) e fonte das pesquisas acadêmicas voltadas ao conhecimento mais amplo das decorrencias do Trabalho por Turno de Escala de Serviço no trabalhador e na sociedade.

Regulamentar o que já é regulamentado: absolutamente toda OM (Organização Militar) -- ou mesmo a organização civil -- de ATC que se preze conhece seu histórico de pico de movimento e sabe, no seu aspecto prático e sem considerar aspectos de fatores humanos como ritmo circadiano, alocar seus recursos humanos disponíveis para cobertura das necessidades operacionais destes horários. Portanto, não necessitam da Projeção ou do Planejamento de Demanda do CGNA, porquanto esses horários seguem uma constante determinada pelo atendimento das companhias aéreas às preferencias de seus passageiros: chega de manhã e sai à noite.

Ora, o pouco que entendo de ATM é que um gerenciamento eficaz e eficiente pode e deve evitar a saturação de um setor e a consequente subutilização de outro, estabelecendo pela via de um efetivo CDM o balanceamento da demanda de tráfego projetada e percebida. A interferencia direta do CGNA nos órgãos de controle, além de destruir as
estratégias de separação de tráfegos ainda na posição Solo (GND) dos aeroportos de maior movimento, cuja agilidade e segurança confluem na separação tática por esteira de turbulencia e por perfil das Subidas autorizadas pelos APP (Delivery Control), também potencializa a indisposição entre si dos vários atores que se interrelacionam no cumprimento das tarefas da prestação de serviços, ou da entrega do que chamei de "Pacote de Segurança" ao seu cliente estratégico (foto).

A Publicação ICA 100-25 é minuciosa em certos aspectos mas não contempla na sua minucia, por exemplo, a proibição de se alocar recursos humanos em Escala de Trabalho por Turno de Serviços que incompatibilizem o ritmo circadiano com o pico de movimento da localidade. Se o histórico de demanda de tráfego nos diz que os picos estão, em geral, alocados entre as 06h e 09h e depois entre as 17h e 21h, não poderia um turno de serviço terminar às 08h! Que condições tem esse trabalhador, que tanto de cafeína ele não se utiliza para compensar o baixo rendimento etc?

Assim, o item Definição dos Turnos (pg. 11) poderia muito bem ser alvo apenas de um Manual do Órgão ATC que já é previsto existir por outra Publicação Normativa denominada CIRTRAF 100-20. Mais ainda, como sabemos, há regulamentação para civis estatutarios, para militares e para civis celetistas que diferem umas das outras, embora os gestores de ATC do âmbito civil provenham a maioria da mesma cepa castrense e reproduzam nas ações e decisões o que aprenderam/aplicaram na propria formação.

Não me convence o objetivo que fundamenta a existencia do PIMO (item 2.6) proposto em "2.5 É responsabilidade do Comandante ou Chefe da OM manter os graduados da especialidade BCT eficientemente instruídos e preparados, não só para atender as atividades operacionais, como também as do expediente administrativo e situações de emergência." (pg. 8) se a reação da Autoridade Aeronáutica foi de, a partir da revisão de 2007 na ICA 100-18, a qual versa sobre licença de trabalho e Habilitação Técnica, diminuir a carga horária do período de capacitação na EEAR e do tempo de obtenção ou renovação da habilitação técnica para trabalhar em específicos órgãos operacionais do ATC.

Retirou-se a formação eminentemente militar na EEar em prol da formação técnica. Portanto, o que se capacita lá são civis que usarão farda e que aprenderão o RDAER (Regulamento Disciplinar da Aeronáutica) durante o OJT (on the job training), também abreviado na sua duração, ou nos momentos de PIMO. O documento mencionado no 2º parágrafo deste comentário auxilia a entender a especificidade do trabalhador do ATC brasileiro, usando as considerações levantadas pelo proprio Comandante do Terceiro Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (CINDACTA 3) Cel. Av. Luís Gonzaga Leão Ferreira na confecção de resposta positiva à questão que levantei: Unicidade de Gestão: que benefício traz ao ATC brasileiro?

Como adendo final, reproduzo as palavras da Procuradora Mabel Seixas Menge na análise procedural do caso (link):

"No que pertine à alegada violação ao princípio constitucional da igualdade, é de salientar que os controladores de tráfego aéreo e os demais sargentos exercem atribuições diferenciadas, não havendo que se falar em tratamento isonômico na presença fática de desigualdade. Exemplificativamente, mencione-se a duração dos turnos de serviço dos controladores – 24 (vinte e quatro) horas de duração – em oposição aos turnos dos militares alocados no apoio administrativo, cujas tarefas são executadas durante o horário de expediente. Desta feita, imperativo o reconhecimento da desigualdade, autorizativa do tratamento diferenciado para pessoas que se encontram em situações distintas."

Espero que a reflexão acima contribua positivamente com a concepção do ATC/ATM nacional que receberá a COPA em 2014 e as Olimpíadas em 2016.

Abraços,

Bemildo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Não me venha com cicuta! Deixe-me filosofar! "- A verdade não está com os homens, mas entre os homens." Sócrates
Que desgraça maior pode haver do que a desesperança? O que pode ser tão frustrante quanto um coito interrompido senão um ideal desfeito? O que pode ser mais desanimador hoje do que a chegada dessa ICA 100-25, quando esperávamos ansiosamente por algo mais nobre, como por exemplo o reconhecimento profissional? Enquanto nos esforçamos gratuitamente para atingir a excelência no trabalho ATC, tropeçamos nesse obstáculo burocrático, descabido e desagregador. Basta passar rapidamente os olhos nas páginas da dita cuja e de pronto já se sente o peso indigesto da discriminação e do preconceito contra o Controlador de Tráfego Aéreo. Mesmo estando na reserva senti-me ferido por essa formalização de apartheid castrense. Deveria ser motivo de honra pertencer à única especialidade do SISCEAB que, pela responsabilidade agregada ao desempenho da função, tem uma instrução só para si, mas não é. Diferente do que se propunha o falecido Manual do Controlador, essa instrução não se manifesta na direção da segurança, da qualidade do trabalho e de vida. Simplesmente recria dentro da corporação uma justificativa para o uso da palmatória, dos joelhos no milho e reedita o chapéu adornado com orelhas de burro, para subjugar e assediar coletivamente seus subordinados, justamente aqueles mais comprometidos e sensíveis à segurança aérea. Acredito que pelo "anda r da carruagem", numa primeira revisão da publicação, podemos esperar a inclusão de emendas como "O uso racional do corrimão nas escadas da TWR"; "Procedimentos para a profilaxia bucal e de próteses dentárias do ATCO", ou ainda "Tabela de altura para cálculo do distanciamento correto do vaso sanitário para a micção masculina em pé". Não imagino onde isso pretende nos levar. Temo que o País pague novamente um alto preço por esses ingênuos equívocos que, de efeito retardado, eclodirão somente daqui a cinco ou dez anos, exatamente quando seus idealizadores já estiverem afastados da ativa da Força e a salvo das responsabilidades administrativas, que o tempo se incumbirá de apagar. Nós já assistimos a esse filme. Amanhã a história se repetirá, reeditada com um novo diretor, novo elenco, novos equipamentos, novos sistemas, mas conservando os velhos problemas de ontem e de hoje. Num País de esfomeados, de escassez de oportunidades, onde um chefe de família prostitui suas filhas em troca de cestas-básicas, não será difícil arregimentar rapidamente voluntários, em quantidade suficiente para suprir as lacunas deixadas pelo o êxodo dos BCT. Também não será difícil convencer a opinião pública entupindo as torres de controle com jovens uniformizados e servis. E se hoje a questão da qualificação operacional já nos preocupa, o que dizer desse futuro próximo quando a baixa capacidade técnica, a baixa qualidade intelectual e a alta rotatividade na carreira, depararem-se com o vertiginoso aumento das operações aéreas decorrentes da Copa do Mundo de 2014 e, quem sabe, das Olimpíadas Rio 2016? Até quando será possível "alugar os dinossauros do ATC" como se fossem carpideiras a comporem o teatro que disfarça as fraquezas do Sistema? Não temos muito tempo para corrigir essa deriva, pois a situação se encaminha para uma condição endêmica no SISCEAB. Se não houver um empenho coletivo, se uma respeitosa união de todos os níveis hierárquicos não se consolidar em torno da questão, podem ter a certeza de que em breve a segurança aérea estará sendo silenciosamente estuprada, exposta a riscos indescritíveis, incalculáveis e inacreditáveis.
Mário Celso Rodrigues
SO BCT R/R