quinta-feira, 26 de julho de 2007

Comentário à Lei.

Breves anotações acerca do Projeto de Lei que regulamentará a profissão de Controlador de Tráfego Aéreo no Brasil (partes mais importantes).

O Projeto de Lei nº 1903 de 2007 do Sr. Dep. Celso Russomanno, vem sanar, desde há muito, a lacuna faltante na seara do Tráfego Aéreo brasileiro, e o cenário não poderia ser outro (apagão aéreo). A crise no setor, dentre tantas mudanças que necessitam ser realizada, pedia urgentemente uma iniciativa dessa envergadura; pois, sem olvidar das demais deficiências que envolvem a aviação nacional, exaustivamente exploradas na imprensa e nos anais do Congresso Nacional, a regulamentação da profissão de Controlador de Tráfego Aéreo soa como um grande avanço, inserindo o Brasil no rol dos países atualizado nessa matéria.
Considerando que a Lei ainda está em sua fase introdutória (projeto-iniciativa) e que terá que percorrer todos os procedimentos legislativos, passando pelas fases constitutiva e complementar, das quais prevê deliberações parlamentares, a saber: discussão, votação e aprovação; deliberação executiva, sanção ou veto; e, por fim, promulgação e publicação, seria de bom alvitre que toda prudência por parte de quem de interesse fosse dispendida no processo, vez que se trata do mais completo procedimento de criação de uma Lei, o processo legislativo ordinário.
Nesse aspecto, é válida toda discussão acerca da propositura visando à construção de um texto enxuto e objetivo para que nenhum embaraço surja de surpresa no campo da sua eficácia, após sua entrada no ordenamento jurídico pátrio. Sendo assim, ressalta-se imperioso considerar que os termos aludidos na iniciativa comportam todas as particularidades existentes na profissão (ainda não reconhecida), o que não torna o alvedrio do ínclito parlamentar diminuído, pelo contrário, como a complexidade sobre o assunto é tamanha, quis o autor, com louvável esforço, abranger todos os casos, remetendo para atos futuros, por parte das autoridades competentes, os amoldes essencias à execução da esperada Lei, nos termos do Art. 7º do projeto em epígrafe.
À guisa de ilustração, vide a previsão no Art. 2º que invoca apresentação de carteira profissional e diploma de curso superior de formação correspondente ministrado oficialmente. Não há dúvida que a elevação da qualificação ao grau superior concretiza um sonho antigo; contudo, como ao norte mencionado, outras alterações acessórias teriam que vir em caráter somatório, v.g., o MEC, por meio do Governo Federal, pode ser fundamental trazendo as diretrizes necessárias na configuração de um curso superior, para melhor definição do Art. 6º do projeto aqui discutido. De conseguinte, a exigência da apresentação de carteira profissional, constante no artigo 2º sob comento, alcança somente aqueles Controladores oriundos da CLT (Dec. Lei 5.452/43), dispensados os demais estatutários, Militares (Lei 6.880/80) e os Dacta’s (Lei 8.112/90).
Os requisitos carga horária de cursos (Art. 8º), formação (Art. 10º), análise e cumprimento do anexo I da OACI (Art. 7º § 2º e Art. 9º, IV) bem como demais condições para ingresso na profissão, ter-se-ão a supervisão geral do Comando da Aeronáutica. Isso preocupa os defensores da desmilitarização que não acreditam mais em aperfeiçoamento do sistema concatenado com ideologias militares. Com efeito, o objetivo do Projeto, se convertido em Lei, não é resolver as mazelas sócios-técnicos-operacionais, mas, tão somente, a inserção dessa tão sofrível profissão na lista das reconhecidas, mediante uma Lei específica.
De outra feita, vale trazer a lume o disposto no artigo 12 que não prevê nenhuma complementação aos diplomas dos Controladores antes da referida lei de regulamentação. O dispositivo torna aceitável uma acepção lógica, dada as vastas experiências atingidas por todos os profissionais inseridos no sistema durante anos a fio, alguns com mais de 20 anos de serviços prestados, tendo concluído a maioria dos cursos de aprimoramento da área, etc., logo são conhecedores das nuances do tráfego aéreo, inclusive, das partes deficientes, que, não raro, foram graças a esses cabedais de conhecimentos desses anjos da guarda da aviação, que livraram várias aeronaves de momentos desconfortantes nos vôos costumeiros, Brasil afora. Portanto, cabe desonerá-los, como faz esse instrumento legislativo, da cobrança das novas regras prevista neste projeto, por se tratarem de profissionais dotados de invejáveis habilidades no trato do controle aéreo nacional.
Resta evidente a importância do cômputo das horas extras nas jornadas de trabalho do Controlador (Art 21), muito embora o limite de 160 horas trabalhadas (Art. 19) não perfaça o melhor cálculo para fins de cumprimentos das regras internacionais, que prega um quantum ideal de 120 horas. Além do mais, novamente, vê-se a não aplicabilidade aos Militares (horas extras), porque esses não estão sujeitos às prerrogativas das leis trabalhistas, o que corrobora para ameaça à eficácia da futura Lei sob análise; a menos que uma série de atos do Poder Executivo e Legislativo desmilitarize a função a fim de dar vazão a migração dos Militares voluntários para a nova estrutura.
Mister é asseverar o mandamento do disposto no artigo 28 do presente, que versa sobre o lapso de apenas 3 (três) anos de exercício pleno na função para assunção do cargo de Supervisor nos órgãos de controle correspondentes (TWR, APP e ACC). Esse ponto carece de prudência ao generalizar toda a senda operacional multifacetada, tendo em vista que há lugares cujo controle de tráfego é extremamente complexo, a exemplo do ACC-BR, TWR-BR, APP-SP, APP-RJ, etc., Mesmo em atendimento aos preceitos do § 1º do citado artigo. Sendo assim, cada particularidade deverá ser estudada numa concepção rigorosamente técnica para traçar um gabarito mais profícuo a ser aludido no dispositivo.
É de acrescer que os artigos 30, 31 e 32 do citado contemplam uma situação similar a de uma relação patronal e sindicato de trabalhadores, existindo como órgão máximo representativo a FEBRACTA, e, em grau menor, o SNTPV, sem os quais, nenhuma negociação ou acordo entre o empregador e os empregados teria a eficácia devida. Repita-se, como conceber a concretude dessa parte se essa não é a tônica das Forças Armadas do país, neste particular, a Aeronáutica? Assim, a futura Lei parece prevê uma realidade promissora que ainda não chegou aos nossos ouvidos.
Em continuidade, o Projeto, em seu artigo 42, deu azo para uma medida administrativa que pode se transformar numa arma predileta daqueles gerentes que incorrerão em alguma incompatibilidade de relacionamento interpessoal para com o profissional injustiçado, sendo o interesse da administração usado como ponto nodal da questão. Basta imaginar que, a transferência transitória (90 dias), ao ser convertida em permanente, resultará em graves transtornos para o operador, se a mesma vier em caráter de surpresa para este. É sem duvida uma previsão merecedora de maiores discussões, já que visa dar um giro de um grau elevado na vida pessoal e familiar do trabalhador.
Cabe notar que sobre o tempo para aposentadoria, a previsão é de que deverá ser de 30 anos de serviços prestados ou 60 anos de idade para partida compulsória (Art. 49). A inovação está na idade da compulsória que aumentou de 54 para 60 anos (regimento militar lei 6.880/80 Art. 98, I, “c”, redação dada pela Lei 7.666/88). Vale lembrar que todas as gratificações permanecerão na inatividade, particularidades mais do que justa, haja vista que o Controlador doa parte de sua saúde ao sistema em prol da comodidade dos aeronavegantes; porém, nada impede que outras benesses possam ser plausíveis em face de negociações coletivas (Art. 53). Noutro giro, uma das inserções mais importantes nesse corpo normativo é o trazido no artigo 55, o qual amplia a competência do CTA para fazer parte das comissões de investigações de acidentes aeronáuticos, nesse passo, ganha mais a sociedade que na hora de um acidente precisar implorar pela abertura de uma série de caixas pretas para obtenção de informações a respeito de seus entes, não que os acidentes façam parte da operação, não é esse o pensamento, trabalha-se diuturnamente para que eles não acontecem.
Sem embargo do expendido, os demais artigos, parágrafos, incisos e alíneas deixadas de ser abordado nessas poucas linhas, foram em decorrência do fiel entendimento de que o autor do Projeto esforçou-se ao máximo para coletar as principais regras constantes na legislação interna, específica ao controle de tráfego aéreo. Por se tratar de normas contidas em textos esparsos, tem-se que o trabalho foi de alta compilação que teve como fito disciplinar, conceituar, regulamentar, definir competência, dentre outras providências atinentes ao ofício dos CTA’s.
Finalmente, o Congresso Nacional e o povo brasileiro, usuários da aviação em geral, que por várias vezes tiveram suas vidas (rotina da aviação) nas mãos dos Controladores de Vôos, mesmo sem saber da existência desse profissional, acena reconhecer pelos mecanismos legais a importância dessa profissão. Embora tal iniciativa tenha sido ensejada nos idos dos anos 80 pelo Senador Nelson Carneiro (PLS n.º 186), a esperança desse dia nunca acabou. De resto, esperamos pela coerência e pela sensibilidade dos parlamentares do Congresso em realizar esse feito. Uma Lei que regulamentará a função dos CTA’s representará o maior de todos os passos até agora, já que de concreto, em matéria legal, nada tem. É tempo, pois, de instigar técnicos e estudiosos no assunto na confecção da Lei/Bíblia dos Controladores de Tráfego Aéreo brasileiros.

Ney Sfair

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